segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

17:40, primeiro de dezembro de 2014


um frio afiado nos pés
como uma emoção acidental
uma força não agressiva
me acorda para a paisagem diminuída pela janela.
não há, no que vejo, a intensa luta política
                                          -ou seu burburinho
e nem ao menos um incômodo que peça confissão.


em movimento as coisas se deslocam como em traços de Monet
não há regularidade imposta
e se aceita toda tentativa de sentimento.

todos os pecados foram cobertos
e não há nenhum que esse vento frio de dezembro
possa descobrir.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014


ainda se deitam sobre meu travesseiro
seu nome junto à minha cabeça,
a idade média
a lembrança da janela
                             - essa terrível

ainda são cordões e estrada
seus dedos,
a torre da igreja onde pouso dois poemas decorados
tudo a que me seguro

contornos em vermelho frio
sua feição arcaica
onde dorme minha sombra
todo frio ou calor

ainda se deita sobre meu travesseiro
seu nome junto à minha cabeça
Ao boêmio ou poema para Vinicius

Ah, mas o moço com o violão
tão afinado
tão apaixonado
tão condizente,
é tão bossa nova
é tão permanente.
IV

a sujeira sobre o tapete
essa toalha estendida
o mofo
essa umidade toda

a tarde é lânguida nessa hora
tem hálito doce esse pouco vento

as coisas são cortadas pelo sol da fresta
uma forma sorrateira de adentrar e quase aquecer

é de comover tanta orfandade
tanto sol nas costas
esse trem que passa



Às quatro da tarde
                -quando naquele dia ainda claro-
peguei seu retrato de menino,
gravei dele suas perninhas tortas
todo olho curioso
e aquela ansiedade sem disfarce
                -salutar, mas ansiedade.

Desde ali te amei.
Você tão pequeno em posse de um mundo tão grande
tão inconsequente isso tudo, falei pra mim.

Desde então tem sido assim:
você gravado
me acompanhando pra todo lado
desde menino.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

qualquer intensidade vale a pena                                                   

latejante e súbita
textura de lençóis, cobertores confusos
em sala-meia-luz
janela e cortinas entre-abertas
                                     -meia luz, tudo susto-

do medo e do sobre-natural do toque na pele
o comedido, de que serve?
o absurdo, o medo, a ânsia
                                   -toda intensidade vale a pena-

unha, fio de cabelo, poro
inspirar, levar pro fundo toda inquietude
tudo que pulsa
que vive e move
toda senação
                               -todo absurdo vale a pena-

                         

quarta-feira, 11 de junho de 2014

III

ela encarada
sobre si mesma
era ele

aqueles dentes afiados
na boca de febre

um bem-me-quer
mas que de tão longe

não ecoa

quinta-feira, 8 de maio de 2014


      O Inferno de Dante tornando a vida possível.      



                                             

                                           

terça-feira, 6 de maio de 2014

                                                                           foto de Ricardo Castilho






poema para Ricardo



foi onde te vi,
em toda pesca, toda luz e sombra
na cor latente que paralisava em paisagens
                                                     -uns ares-
que te transformavam em mundo

era tudo,
a dança macia das águas-quentes mercúrio
o movimento certo das aves cortando o nada
o sol-mancha

você todo
transformado em olhos
sequestrando a infinitude dos movimentos que se perdiam
                                                                         -por vezes
nesse retrato, onde eu, de repente, me sinto tão pequena



me vi, tão de repente, tão pequena.

sábado, 3 de maio de 2014

Ao Homem com a Flauta II

Me detenho nos verbos dessa tarde
que aplainam sensações.
Me alargo até elas com a mesma firmeza de um caule.

Sua brevidade nas janelas,
nos objetos e alimentos
uma comedida euforia nas pontas dos dedos
e suas possibilidades de toque.

Ares de veludo
formas
e um amor que espera.

quarta-feira, 26 de março de 2014


Ao Homem com a Flauta


O que sai da sua boca
voz ou vôo
me ataca todas as paredes e dissolve.

O que tens por trás dos dentes e língua
em forma de asa
colore olhos, é pincel e terror.
O que move a dança secreta dos seus dedos
faz sair da sua garganta um sinal de embriaguez
vermelho turvo e macio.

Das pálpebras, o mundo após
acordo
e em nada, afogo.





terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Das razões

Carregava o desejo de significar palavras,
encabulado com acentos e suas consequências.
Mais ôu menos às cinco da tarde tinha vontade de mar e areia;
carregava seus ecos e vibrações
sombreando debaixo dos pés seu próprio peso.
A variação do sol entre os dedos
trazia-lhe possibilidades de portas e janelas
uma alusão desesperada de vastidão, como em pássaros.
De sobremaneira
eram sentimentos de acácias que lhe apalpavam o coração.